Jornalismo de investigação em destaque no Congresso da AIPS

O Jornalismo de Investigação em português esteve em destaque no 83.º Congresso da AIPS (Associação Internacional da Imprensa Desportiva) que decorreu em Budapeste. O brasileiro Jamil Chade ganhou o Prémio dessa categoria, entregue na Gala de segunda-feira no Hotel Corinthia da capital húngara – onde decorreu todo o congresso – e participou num painel com Nazim Bessol (Tunísia) e Sebastian Torok (Argentina). 

Jamil Chade esteve na base de boa parte das notícias sobre corrupção nos Jogos Olímpicos e do Campeonato do Mundo que se realizaram no Brasil. “O Mundial acabou com o governador do Rio na prisão, tal como o vice-governador e o governador antecessor destes”, disse o jornalista brasileiro no painel moderado por Gianni Merlo, o italiano que preside à AIPS.

Chade vive hoje na Suíça, trabalha para vários meios (como o portal UOL e o Estado de S. Paulo), é autor do livro “Política, propina e futebol” e considera que as grandes realizações desportivas desencadearam tais problemas que “os 7-1 da Alemanha ao Brasil foram a mais pequena das humilhações”. Para o jornalista brasileiro de origem libanesa, “há muitos problemas e até o facto de uma TV comprar direitos de jogos e de competições põe a questão de saber se essa tv está em condições de olhar jornalisticamente para essas realizações e federações – é preciso que o lado jornalístico esteja completamente separado do resto”.

Nazim Bessol foi um dos jornalistas na base da divulgação de documentos comprometedores para Ahmed Ahmed, presidente da Confederação Africana de Futebol. Cerca de 350 milhões de dólares terão sido desviados por um dos conselheiros mais próximos do presidente da CAF, que continua no lugar mas é a FIFA que co-administra a CAF, precisamente por causa destas revelações. 

O argentino Sebastian Torok (do diário La Nación) falou do caso que denunciou no ténis, “match fixing” nos torneios de terceiro escalão. “Marco Trungelliti decidiu falar e nós publicámos. Era uma rede em que jogadores que podiam ganhar 1.100 dólares num torneio, tinham propostas de dois a quatro mil dólares só para perderem um jogo. Daí se vê a diferença. A polícia chegou a vários jogadores e Trungeliti garante que vários tenistas do Top 50 venderam jogos. John McEnroe foi um dos grandes defensores de Trungeliti mas, segundo Torok, o “wistleblower” argentino não foi apoiado por toda a gente, apesar do seu gesto em defesa do desporto. A TIU, a entidade do ténis que faz investigação de casos do género, tem continuado a seguir o caso.

83.º Congresso AIPS

Os trabalhos começaram na segunda-feira com um encontro com Gianni Infantino, presidente da FIFA, e nessa noite teve lugar a gala de entrega dos prémios, com excelente organização e transmitida em direto por uma televisão da Hungria. O português Ivo Costa (SportTv) esteve nos dez finalistas na secção de “perfil de atletas em vídeo”, que foi ganha por Andrew Leibman (EUA). O vencedor de cada categoria teve direito a um troféu e 8.000 dólares, o segundo a 3.000 dólares e o terceiro recebeu 2.000 dólares.

A lista completa de premiados pode ser encontrada aqui.

Os dois dias do Congresso viram passar pelo palco a diretora de Comunicações do Comité Olímpico Internacional, Lucia Montanarella, o diretor do Olympic Channel, Konstas Vernikos, o presidente da Federação Internacional de Body Building (IFBB), Rafael Santonja, o secretário-geral da FISU (Federação Internacional do Desporto Universitário), Eric Saintrond, ou o presidente da IAAF, Sebastian Coe, que fez uma reflexão muito interessante sobre a relação dos Media com o Desporto, dos seus tempos de atleta até agora.

Seguido com muito interesse foi também o debate do último dia sobre “Empoderamento das Mulheres no Jornalismo Desportivo”, moderado por Zsuzsa Csisztu e que contou com a tenista Timea Babos (Hungria), Donna de Varona (EUA), jornalista da NBC e antiga nadadora com duas medalhas de ouro nos Jogos de Tóquio em 1964, Evelyne Watte (Quénia), da Televisão Queniana, e Zahra Aliee (Irão), jornalista.

Evelyne defendeu que as mulheres “devem investir na profissão, quer a fazer coisas quer em networking” e lembrou que África e Ásia são os continentes que têm maior número de jornalistas femininas, apesar de isso não ser evidente para europeus ou americanos. Donna de Varona, falando da sua carreia de jornalista, lembrou que teve de levar o filho com três semanas para os Jogos de Inverno em Calgary; ou seja, as mulheres têm sempre algumas limitações. “Mas de resto são capazes de ser tão boas profissionais como os homens”, acrescentou.

Outra presença feminina foi a de Sofia Polgar, antiga campeã de xadrez, hoje retirada no Canada com o marido, também ele jogador de xadrez. Ela é a irmã do meio – Judit era a mais famosa -, mas deixou muitos ensinamentos no Salão de Dança do Hotel Corinthia, de Budapeste, onde decorreu todo o Congresso da AIPS. O presidente da Federação Húngara de Xadrez, Laszlo Szabo,  acompanhou Sofia no palco porque o pais quer organizar a Olimpíada de Xadrez de 2024. A Hungria é um país de xadrez, com mais de 300 clubes e 10 mil jogadores federados.

O secretário de Estado para o Desenvolvimento de Budapest, Balasz Furjes, também teve uma intervenção, nomeadamente no jantar de quarta-feira, no novo Estádio Ferenc Puskas, onde Portugal jogará em junho no Euro 2020. A última noite teve lugar no Parlamento húngaro, com uma visita ao magnífico edifício terminado em 1904 e o jantar volante servido numa das salas.

Foi uma organização de grande nível dos nossos colegas húngaros, cuja organização completou 110 anos e foi fundadora da AIPS. Justificados parabéns, portanto, para Gyorgy Szolosi, presidente da Associação dos Jornalistas Desportivos da Hungria e vice-presidente da AIPS Europa.

Eleições associativas

Em 2021 haverá eleições para todos os órgãos da AIPS. Neste congresso houve a eleição de um membro para a AIPS Europa, lugar que foi conquistado pelo holandês Gio Lippens, jornalista muito ligado ao ciclismo e que trabalha para a NOS (tv holandesa). Uma eleição a que concorreu também o presidente do CNID, Manuel Queiroz. Entre quatro candidatos, Lippens foi o eleito.

Infantino quer Super Liga em África

O presidente da FIFA disse em Budapeste, a 3 de fevereiro,  que a sua missão é fazer do futebol “um desporto global” e propôs à Confederação Africana três medidas: profissionalizar 20 árbitros e a FIFA encarrega-se deles, em formação e pagamento; investir em infra-estruturas e criar uma Super Liga de clubes que “teria 200 milhões de euros de receitas” e que permitiria a muitos clubes terem continuidade na competição e desenvolverem-se. 

“Há um ‘gap’ cada vez maior – a Europa teve seis dos oito últimos países em prova no Mundial da Rússia – e a FIFA tem que responder a isso. A África é o continente que exporta mais jogadores e temos que fazer alguma coisa”. 

Gianni Infantino falava no Hotel Corinthia da capital húngara, numa sessão denominada “AIPS encontra-se com Infantino” antes do início oficial do Congresso da AIPS (Associação Internacional da Imprensa Desportiva, que em Portugal é representada pelo CNID). Infantino falou ainda dos “mil milhões de euros” que a FIFA decidiu investir no futebol feminino nos próximos anos. ‘Tenho quatro filhas, lá em casa é 5-1, é uma pressão muito grande”, brincou ainda o presidente da FIFA.

O CNID – Associação dos Jornalistas de Desporto esteve representado no Congresso da AIPS, em Budapeste, pelo presidente da direção, Manuel Queiroz.