José Manuel Delgado
Pediu-me o Manuel Queiroz que escrevesse algumas linhas a propósito do Prémio Carreira que o CNID entendeu por bem entregar-me. Começo por quem dá o nome a este galardão, David Sequerra, jornalista e entusiasta do futebol de formação, que foi quem me chamou, pela primeira vez, aos trabalhos de uma Seleção Nacional. Corria o ano de 1974 e a FPF decidiu criar um segundo escalão etário para as suas representações mais jovens, nascendo assim a primeira equipa de juvenis. As escolhas eram da responsabilidade do selecionador nacional, David Sequerra, e o comando da equipa ficou a cargo de um jovem treinador saído há pouco do INEF, de seu nome Manuel Jesualdo Ferreira (José Moniz encarregava-se da Seleção de Juniores). Foi assim que, na Páscoa de 1975, fui o guarda-redes de Portugal na estreia da Seleção Nacional de Juvenis, no Torneio de Saint-Malo…
Saltemos no tempo – referindo que ao longo da minha carreira de futebolista profissional vi publicados textos em A Bola, Record, Gazeta dos Desportos e Off-Side – e fixemo-nos na encruzilhada em que me encontrei quando decidi pendurar as luvas, em 1989, aos 31 anos. Abriram-se-me, então, três possibilidades profissionais: a primeira ligada ao Direito; a segunda como treinador de futebol, cujo curso tinha acabado de concluir; e a terceira no jornalismo.
Segui a terceira via, com a ajuda do Joaquim Letria que me deu a oportunidade de integrar os quadros da Revista Sábado, que para me acolher criou a editoria de Desporto. É verdade, apesar de ter, à altura, apenas o título profissional de Jornalista Estagiário, fui um editor ‘sui generis’, já que editava-me a mim próprio, único integrante daquela secção…
Já lá vão 32 anos e nunca lamentei a via que segui, e que me levou além da Sábado, a A Capital, Record, e A Bola, que me deram a oportunidade de estar presente em seis Europeus, cinco Mundiais, uma Copa América e uns Jogos Olímpicos.
Assisti, na primeira fila, ao ‘boom’ da comunicação social em Portugal, na década de 90 do século passado, e testemunhei a chegada em força do digital, com as dúvidas quanto ao modelo de negócio que ainda subsistem. As circunstâncias do Mundo mudaram, e não irei, neste espaço, escalpelizar as razões que levam a que hoje em dia as redações sejam mais curtas. A única certeza que tenho é que nunca será possível fazer jornalismo sem jornalistas…
Mas gostava de partilhar convosco algo que tive a fui capaz de interiorizar ao longo de meio século no futebol.
Durante os anos em que joguei, de 1972 a 1989, aprendi muito, quer sobre as dinâmicas do balneário, quer sobre o lado mais profundo da liderança, com todos os treinadores com quem me cruzei, e tornei-me capaz de ler o jogo como só faz quem andou lá dentro. Porém, enquanto jornalista, continuei a aprender com quem, na bancada de imprensa e na redação, tinha uma visão mais analítica do fenómeno, baseada num conhecimento diferente, mas ainda assim muito assertivo, válido e enriquecedor. E sinto-me privilegiado por poder dizer que absorvi, e procuro verter nas minhas análises, o melhor de dois mundos que são vistos muitas vezes como antagónicos, mas que, na realidade, são amplamente complementares.
Mas, afinal de contas, o que é ‘perceber de futebol’?
Para mim, muito simplesmente, é olhar para o jogo e saber exatamente o que está a acontecer, o ‘como’ e o ‘porquê’.
Como jornalista, a missão que se segue é partilhar com o público essa visão, da forma mais clara possível, sem recurso a termos rebuscados, de inspiração tecnocrata, que só servem, por um lado para confundir quem lê, e por outro para mascarar, com vestes de sapiência, um conhecimento incipiente do fenómeno.
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JOSÉ MANUEL DELGADO é Diretor adjunto de A Bola. Foi galardoado com o Prémio CNID 2021 – CARREIRA – David Sequerra.