O diretor jurídico da Liga Portugal disse esta tarde, em Lisboa, que se fosse ele “não teria aberto processo nenhum” à jornalista da Sport Tv que fez uma pergunta a Ruben Amorim sobre declarações de Slimani, no final do Sporting-Chaves, a 27 de Agosto passado.
“Estava no relatório, tinha sido um elemento do Sporting a pedir ao delegado para aquilo constar do relatório, mas não era preciso abrir processo (por parte do o Conselho de Disciplina da FPF). Há factos que estão nos relatórios dos delegados mas a que o CD não dá relevo”, disse o causídico Paulo Roseira na conferência “Flash interviews na Liga Bwin – Direitos e constrangimentos”, organizado pela Universidade Europeia e pelo CNID- Associação de Jornalistas de Desporto e que teve lugar no auditório daquela universidade, em Carnide. Nela participaram o prof. Thiago Santos, coordenador da licenciatura de Gestão de Desporto da UE, o advogado e comentador Luís Miguel Henrique, José Pereira, presidente da ANTF, e Manuel Queiroz, presidente do CNID, além do diretor jurídico da Liga. Pedro Pinto, diretor de Comunicação do Benfica, Nuno Farinha, do mesmo clube, Santos Neves, Paulo Sérgio e Murillo Lopes, do CNID, jornalistas como Sérgio Krithinas e Bruno Pires, professores e alunos entre muitos que encheram a sala.
Numa sessão em que houve posições bastante diferentes, a prof. Carla Costa, em representação da reitoria, começou por agradecer a presença de todos, defendendo que a escola ganha em ser o centro de discussões que ajudem a melhorar a reflexão. A UE está a fazer 60 anos – anteriormente era ISLA – e num momento de pujança.
O advogado Luís Miguel Henrique, que tem escrito sobre o tema no diário desportivo Record e com posições muito próprias, foi o primeiro a fazer o seu “pitch” e defendeu que os espaços televisivos da chamada “superflash” – em que é entregue o troféu de “Homem do jogo” -, e o de “Flash interview” – em que o treinador e um jogador de cada equipa são obrigados a estar presentes e a responder a perguntas, “é um espaço de promoção do jogo, não é um espaço de jornalismo”. Sublinhou que se um cliente seu lhe pedisse opinião lhe diria que, se quisesse, poderia “ir à flash e não abrir a boca”. Esse comportamento seria sancionado pela Liga, mas Miguel Henrique acha que o conseguiria despenalizar. “O operador de televisão tem que cumprir os regulamentos e o artigo 91 do Regulamento de Competições diz que a flash não pode durar mais de 90 segundos e as perguntas têm que ser sobre o jogo”. Considerou que se trata de um “problema multidisciplinar, é de direito e não só de comunicação ou de regulamentos”.
Recorde-se que para além daquele caso de Rita Latas em que o CD da FPF abriu um processo à jornalista para o fechar a seguir, houve outro caso no final do Estoril-FC Porto, em que Sérgio Conceição não se apresentou à flash alegando que o jornalista da SporTv Tiago Peres Costa tinha feito uma pergunta a Taremi que não tinha relação com o jogo. A pergunta fora sobre penaltis de Taremi, que acabara de empatar o jogo dessa forma.
Paulo Roseira abundou na ideia de que “se o regulamento detalha tanto a flash interview é porque faz quase parte integrante do jogo ou do espetáculo, porque diz quanto dura, onde é, que painéis publicitários podem e não podem estar, indica a indumentária dos treinadores, tudo isso não deixa dúvidas que é um espaço comercial, de promoção do jogo”. E em lado nenhum, sublinhou, “se diz que tem que ser alguém com a carteira profissional de jornalista a fazê-la, isso é uma opção do operador televisivo”.
José Pereira, presidente da Associação de de Treinadores (ANTF) salientou que o protocolo entre a Federação e a Liga prevê vários regulamentos que têm que ser aprovados na Assembleia Geral da FPF “ma curiosamente esse não é o caso do Regulamento de Competições, que é onde está descrito o que é a flash e a superflash”. Ou seja, resulta inequivocamente “de um acordo entre os clubes” e pediu bom senso. “Leio que perguntaram ao Vítor Pereira, no Brasil, quem é que manda lá em casa e isto não é aceitável no final de um jogo – por cá, o treinador tem que ir também à conferência de Imprensa e lá podem pôr todas as perguntas”.
Manuel Queiroz, presidente do CNID, disse que a sua posição não é exatamente igual à de Santos Neves, presidente da AG e jornalista de “A Bola”, já que este defende que os jornalistas não devem fazer as flashes. Para Manuel Queiroz, “trata-se de um espaço de fronteira entre jornalismo e comunicação, mas sendo um jornalista a fazê-la não pode ser limitado nas suas perguntas para lá do bom senso de um contexto de emoções e cansaço de final de jogo e de o treinador e o jogador estarem obrigados a estar ali”. Ou seja, se for um jornalista, o “regulamento ou a sua aplicação tem que ser flexível, como é sempre, seja aqui, na Liga dos Campeões ou nos campeonatos do mundo, onde nunca houve problemas e muitas vezes se sai um pouco do que foi o jogo, porque há atualidade”.
O debate foi alargado depois ao público e o diretor de comunicação do Benfica defendeu também “que se trata de um espaço de promoção do jogo – é óbvio que se estivesse na posição da Rita Latas ou do Tiago Peres Costa faria aquelas perguntas, porque o faria como jornalista, mas entendo que aquele espaço é muito próprio”. E sobre a pressão de um final de jogo, deu o exemplo de Lewis Hamilton, quando há uns meses lhe tiraram, “numa decisão errada, o Mundial, no final, logo depois de tirar o capacete, como é norma na F1, teve que dizer umas palavras e nas quais deu os parabéns ao adversário sem acrimónias”. Santos Neves teve oportunidade de defender a sua posição de clareza: “Os jornalistas não devem participar nas flashes, porque aquilo não é jornalismo, ponto. O Código Deontológico dos Jornalistas não permite aquilo, o espaço é publicitário, o jogador e o treinador estão ali forçados. Façam a flash interview mas não deve estar ali um jornalista. Porque senão entram num pântano em que um Conselho qualquer lhes abre um processo por fazerem perguntas. É inadmissível!”.
Ainda sobre o processo que a FPF abriu e fechou à jornalista Rita Latas disse que “foi um processo puramente político, que se abriu, se disse à Comissão de Instrutores o que deviam fazer e depois se fechou no dia seguinte a ser aberto”, defendeu ainda que os jornalistas devem perceber que estão dentro de uma indústria. “Nós não temos Imprensa desportiva, temos Imprensa de futebol porque mais de 80% do que publicam é sobre os três grandes e esse foi um dos problemas dos jornais. E quanto melhor for essa indústria, quanto mais dinheiro ganhar, isso também dá mais dinheiro aos jornais”.
Manuel Queiroz chamou a atenção de que os jornalistas “não promovem coisa nenhuma – o futebol português, nomeadamente, chegou onde chegou também porque teve um Jornalismo verdadeiro, que soube apontar o que estava mal e o que estava bem, que foi capaz de ser exigente e de estar atento ao que não vai no melhor caminho”.
Ao prof. Thiago Santos coube a tarefa de finalizar a sessão com as conclusões, salientando a pertinência do debate até para os alunos e concluiu que, apesar das posições divergentes apresentadas e de ser um problema multidisciplinar, se apontar na direção de a flash interview ser mais um espaço de comercial de promoção do jogo em que o Jornalismo pode ter lugar mas sob condições.