Vítor Serpa, antigo diretor de A Bola
O jornalista e escritor Vítor Serpa, ex-director de “A Bola”, ex-presidente da AG do CNID, que nos honra com a sua amizade, publicou na rubrica semanal “Porque hoje é sábado” (03.Fev.2024), no jornal desportivo que liderou ao longo de três décadas, uma interessante e lúcida reflexão sobre o momento actual do nosso País, no qual “os tempos estão a mudar tão evidentemente que, até em Portugal, as claques de alguns clubes de futebol que viveram décadas de impunidade, apesar da evidência dos seus desmandos, das suas acções escondidas numa opacidade conivente, da sua intolerância e violência em confronto permanente com a Liberdade de cada indivíduo, e com as leis da República, estão enfim a ser alvo de investigação criminal”.
Recorrendo a Bob Dylan, esse admirável construtor/cantor de canções emblemáticas nos anos sessenta do século XX,Vítor Serpa recorda uma delas, surgida em 1964 The times they are a-changin’, como um alerta “quanto à força pujante da transformação geracional”. De resto “ninguém é insubstituível e ninguém deverá insistir em ir além do seu tempo.”
Foi isso mesmo que Dylan nos disse naquela histórica canção: “…a sua velha estrada/é rapidamente envelhecida/por favor saia da nova/se não puder dar uma mão/para os tempos que estão a mudar.”
Pois foi … “Os jornalistas (e não só os da área do Desporto) sofreram danos físicos e morais ao longo de muitos anos e as suas queixas perdiam-se na convicção serena das entidades públicas que viam todos os atropelos aos mais elementares direitos cívicos como alguns
excessos “próprios do futebol”. Como se houvesse uma lei para o País e outra para o Futebol. Como se um cidadão que entrasse num estádio decidisse abdicar, por sua conta e risco, dos seus direitos essenciais.”
Continua então o autor.” E repito, foi assim durante décadas.Sucederam-se os governos, os parlamentos, os Presidentes da República e as entidades judiciais , mas o estado de impunidade das claques dos clubes de futebol e a tolerância para com o conluio óbvio
e facilmente detectável entre essas guardas pretorianas e os principais dirigentes manteve-se, sem ponta de remorso.”
Vítor Serpa, entretanto, com a sua longeva experiência e manifesta
autoridade profissional, recorda:
“Sei do que falo. Lembro-me bem de certas assembleias exaltadas, no Sporting, no tempo em que sócios endoidecidos rasgavam os blocos de notas dos jornalistas perante a passividade dos dirigentes…;”
“… como recordo os tempos em que um presidente do Benfica mandava os jornalistas para uma bancada de imprensa, a que chamávamos “a esplanada”,colocada estrategicamente no meio da bancada dos sócios, sem qualquer resguardo ou controlo policial…;”
“… e, evidentemente,que me recordo bem do clima de intimidação e das cenas de violência brutal no velho Estádio das Antas, no tempo do famigerado guarda Abel.”
E constatou,então, o autor: “Ninguém ligava a queixas e cada clube usava a sua guarda pretoriana à luz da conveniência dos seus regimes presidencialistas, absolutistas e, sobretudo, intocáveis.”