“O relato é um acto de cultura”, diz Pedro Azevedo

“Há outro capítulo dedicado só ao Ribeiro Cristóvão, que é a minha referência. Por todas as razões, até afetivas. E como um dos géneros jornalísticos mais importantes é a entrevista, faço-lhe uma entrevista onde diz coisas que nunca disse sobre muitos aspetos da vida e da carreira.

(Ribeiro Cristóvão é ainda um dos melhores de nós todos, felizmente ainda a trabalhar e a mostrar todo o seu saber e toda a sua experiência. Foi um dos mentores do Pedro Azevedo. O CNID distinguiu-o com um Prémio Carreira neste ano de 2024, na Gala de Viseu onde, de resto, esteve o Pedro Axevedo).

“Há outro capítulo que eu chamo o meu capítulo e que tem o título ‘Psicologia cultural’. Eu criei uma imagem de marca que é a minha voz. E a partir dela criei um idioleto, como todos os relatadores criam ao fim de alguns anos, que são aquelas formas de dizer que são as nossas marcas. O meu idioleto caracteriza-se por uma linguagem despojada de cargas literárias e o uso de expressões populares.Tenho muitas expressões, da sardinha na canastra, ao canto de sereia, até ao espalha-brasas de que o seleccionador Roberto Martinez agora fala muito a propósito do Chico Conceição. Não as inventei, elas estão no Dicionário de Frases Feitas de Orlando Neves, de 1991. Mas eu inseri-as no relato desportivo e repeti-as, de alguma forma fiz delas uma marca minha, ajudaram a criar o tal idioleto. O relato é um exercício de comunicação mas também um enorme embaixador de cultura, de resto, os termos do relato desportivo são apropriados por todas as áreas, a começar pelo política. Ainda há dias ouvi um governante a falar no pontapé de saída do Orçamento de Estado.

(O relato de jogos de futebol como ato de cultura, uma bela ideia que vale a ideia de um livro)

“Outro capítulo refere-se ao ciberjornalismo, muito atual, porque hoje o relato coabita com o jornalismo online, até com o relato online. Todos os grandes jornais fazem relatos escritos na net dos jogos, Por isso hoje mais do que em ouvintes falamos em usuários, porque podem escolher o meio pelo qual seguem o jogo. E este jornalismo é diferente porque desde logo é interativo ou permite a interatividade – no momento em que digo qualquer coisa pode haver alguém a comentá-la na net. Depois o ciberjornalismo permite o hipertexto, o link no meio do texto que permite aceder a estatísticas por exemplo – num relato escrito, um golo de Samu, Gyökeres ou Aktürkoglu pode ter um link para o número de golos que esses jogadores já marcaram, se foram de cabeça, de pé direito ou de pé esquerdo etc.

“O último capítulo é a minha visão pessoal sobre o que acho que é o jornalismo do séc.XXI e o novo papel do jornalista moderno num contexto de consumo de informação mais acessível e rápido , incorporado num ambiente de forte concorrência e informação sem limite. Um jornalismo de convergência tecnológica numa era que o mundo se fez ecrã. Aquilo que o prof. Luís Humberto Marcos designa de ecrãvidência, o poder do ecrã, que é quase uma prótese dos humanos de hoje, estamos sempre a olhar para o ecrã e às vezes para dois ou três ao mesmo tempo.

(Luís Humberto Marcos dirigiu o Museu da Imprensa, no Porto, foi jornalista, ajudou a criar o Centro de Formação de Jornalismo, é professor na Universidade da Maia).